ERA DE EXTREMOS

Em: 02/06/2021. DE: Revista PUC MINAS – EDIÇÃO 23

Professores refletem sobre o radicalismo ideológico, que ataca a democracia, as instituições e nega a ciência.

No dia 7 de janeiro de 2021, uma multidão cercou e invadiu o Capitólio, o prédio em que se instala o centro legislativo federal do estado norte-americano. Os radicais tentaram impedir a confirmação da eleição do candidato Joe Biden, vencedor do pleito. O grupo havia se insuflado por meio de discursos do candidato derrotado e na época presidente dos Estados Unidos da América (EUA), Donald Trump.

Antes disso, outro ato de manifestação de extremismo de direita ocorreu em solo brasileiro, no sábado, 13 de junho de 2020, quando a ativista Sara Fernanda Giromini, mais conhecida como Sara Winter, líder do movimento armado de extrema direita 300 do Brasil, lançou fogos de artifício contra o prédio do Supremo Tribunal Federal (STF) em Brasília. Os manifestantes pediam a intervenção militar, a volta do AI-5 (Ato Institucional número 5), um marco da ditadura brasileira, e o fechamento do STF. Esses são apenas alguns dos exemplos em meio a uma onda de extremismo político e ideológico existente nos EUA, no Brasil e em outros cantos do mundo, que vêm à tona nos últimos tempos.

Para entender o que há por trás dessa radicalização política e ideológica, como se instituiu essa cultura difusa do autoritarismo e como a política se torna agregadora de visões racistas, antidemocráticas, entre outras, ouvimos especialistas da PUC Minas e de outras universidades.


Na opinião do professor Robson Sávio Reis Souza, coordenador do Núcleo de Estudos Sociopolíticos (Nesp), órgão da PUC Minas e da Arquidiocese de Belo Horizonte, e membro do grupo de análise de conjuntura política da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), o País e o mundo passam por uma mudança epocal neste começo de milênio. “Isso desinstala o que está instituído, principalmente as instituições de poder”, observa.


Para explicar o momento atual, o professor Robson faz uma referência ao filósofo italiano Antonio Gramsci, que diz que a crise consiste precisamente no fato de que o velho está morrendo, e o novo não pode nascer. Nesse interregno, uma grande variedade de sintomas mórbidos aparece.

Esses sintomas mórbidos e perversos, segundo o professor Robson, se multiplicam na atualidade. “Essa mudança epocal reverbera de forma mais intensa e dolorida em uma sociedade desigual, injusta, autoritária, violenta, patriarcal, cujas elites e classes médias, historicamente impediram o avanço dos processos civilizatórios”, assinala o professor Robson Sávio.


A manifestação desses sintomas mórbidos ressoa na grande onda de extremismo de direita existente em muitos países atualmente. Nos EUA, de acordo com o professor de Estudos Internacionais da Universidade de Oklahoma, onde também co-dirige o Centro de Estudos Brasileiros, Fábio de Sá e Silva, a extrema direita contribuiu decisivamente
para a eleição do presidente Donald Trump, que se apoia em grupos ressentidos de trabalhadores brancos e pobres. “Para os quais ‘o sonho americano’ se tornou inalcançável, já que não conseguem mais mandar os filhos para a universidade e podem ir à falência por qualquer problema de saúde”, explica o professor.


Grupos extremistas também ajudaram a eleger o presidente Jair Bolsonaro, como constata o professor David Nemer, especializado em antropologia de Informática, do Departamento de Estudos de Mídia, da Universidade da Virgínia. Ele
monitora grupos de WhatsApp da extrema direita brasileira desde março de 2018, ano da última eleição presidencial brasileira.

A estimativa dele é que atualmente 120 milhões de pessoas, metade da população do Brasil, faça uso frequente do WhatsApp para quase tudo, como bate-papos em grupos maciços e divulgação e recebimento de notícias comunitárias, nacionais e até globais. “O WhatsApp permite que os usuários participem de grupos massivos, às vezes, com centenas de membros fortes, o que lhe dá um poder especial no Brasil. E, em um país com mídia altamente concentrada, tornou-se uma ferramenta organizadora e uma maneira fácil de manobrar em torno das estruturas tradicionais de notícias”, explica o professor.

A pesquisa do professor David Nemer indicou que os extremistas brasileiros se dividiram em pelo menos três subgrupos: os propagandistas, os supremacistas sociais e os insurgentes. “Dois deles apoiam em grande parte Jair Bolsonaro, um empurrando propaganda do governo e grupos de fake news para convencer o Brasil de que o que está acontecendo no governo brasileiro não está realmente acontecendo. Outro ampliando suas visões socialmente conservadoras de extrema direita, incluindo homofobia desenfreada, racismo e sexismo. Os membros da terceira coalizão tornaram-se uma espécie de insurgência na extrema direita, um grupo de brasileiros que sentem que Bolsonaro traiu sua causa e se tornou um dos seus adversários mais ferozes e radicais”, explica o professor Nemer, autor do livro Favela Digital, o outro lado da tecnologia, sobre o uso da tecnologia em bairros informais no Brasil.

Ele lembra que esses grupos migraram também para redes sociais, como youtube, e passaram a compartilhar links com o objetivo de monetização. Outra constatação é que apenas uma pequena fração de brasileiros pertence a esses grupos e que eles não são representativos de todos os eleitores do presidente Jair Bolsonaro, mas que todos revelam maneiras pelas quais as pessoas estão se radicalizando em aplicativos de mensagens como o WhatsApp.

Leia a reportagem completa de Edson Ramos, na revista PUC Minas, clicando no link: http://www.revista.pucminas.br/wp-content/uploads/EDICAO-23.pdf?v=1