Paz no céu e mais qualidade de vida na terra

Moradores da Regional Noroeste pedem a criação de parque multiuso no aeroporto. Cred. Coletivo Cultural Noroeste

Andrea Castello Branco – 9 de novembro de 2021

A população da região Noroeste de Belo Horizonte tem um motivo a mais para comemorar o dia 31 de dezembro: além da chegada do novo ano, será a despedida do Aeroporto Carlos Prates, depois de anos de insegurança e baixa qualidade de vida provocada pela poluição sonora dos pousos e decolagens. Representa também a vitória dos moradores na luta pela retirada do aeroporto de uma área com grande adensamento populacional. Agora, após a publicação da Portaria 1/2021, do Ministério da Infraestrutura, o que todo mundo se pergunta é: o que será feito na área de 547 mil metros quadrados?

Formalmente, a posse do terreno passará para a Secretaria de Patrimônio da União e, se não houver um convênio com a Prefeitura de Belo Horizonte, é grande o risco de uma área valiosa se transformar num enorme terreno baldio abandonado pela União e esquecido em Brasília. Por isso, movimentos sociais e culturais reivindicam a municipalização do Aeroporto Carlos Prates e já fizeram uma consulta à população do que ela gostaria que fosse feito ali.

Há 15 anos morando na região, Luzia Barcelos, conta que na época do Orçamento Participativo a comunidade conseguiu aprovar o Parque Ecológico Maria do Socorro, no entorno do aeroporto, a partir de um convênio entre a Infraero e a prefeitura que durou 20 anos, mas que não foi renovado. “Nossa preocupação é o aeroporto ficar abandonado como está o parque. Depois que a PBH devolveu para Infraero, a única coisa que continuou funcionando foi o campo de futebol. O parque foi depredado, abandonado, e hoje se tornou um lugar de dependentes químicos e de criminalidade”, conta Luzia.

Para evitar que isso aconteça, a população está se organizando. Uma pesquisa foi feita pelo Coletivo Cultural Noroeste para que as pessoas opinassem sobre a melhor destinação para o espaço. Mais de 530 formulários foram preenchidos e dentre as seis opções apresentadas, a mais votada foi a proposta de criação de um parque de preservação ambiental e prática de esportes. A segunda mais votada foi a de implantação de um” centro cultural e esportivo, com biblioteca, inclusão digital, espaço para prática de esportes e área verde”. Hoje, a Regional Noroeste é a mais populosa da cidade e a que apresenta o menor índice de área verde.

Diante da proximidade e do risco do terreno ser ocupado e depredado, os integrantes do Coletivo Cultural Noroeste procuraram o prefeito Alexandre Kalil para apresentar uma proposta de uso do local. Contudo, Kalil disse que, sem a garantia de recursos do governo federal para a implantação de um projeto de esporte e lazer, a prefeitura não tem como assumir uma área tão grande. O prefeito classificou a doação como um “presente de grego”.

“A prefeitura aceitou a cessão, mas só depois que o parque for implantado. Agora estamos conversando com deputados federais para fazer a ponte com a Aeronáutica. Podemos fazer do prédio e hangares desativados, o Museu Nacional da Aeronáutica Santos Dumont. A ideia é manter o traçado da pista para skate patins, implantar quadras, banheiros, e plantar muitas árvores para fazer de lá um parque mesmo. Na Regional Noroeste a gente não tem parque; temos reservas, mas elas não atendem porque são fechadas”, conta Munish, morador no Jardim Montanhês e um dos integrantes do Coletivo.

Apoio federal

Para ajudar nesse acordo e fazer do Aeroporto Carlos Prates uma parte viva da cidade, os deputados federais Rogério Correia (PT-MG) e Áurea Carolina (PSOL-MG) têm se empenhado no diálogo tanto com o governo federal quanto com a Prefeitura de Belo Horizonte. A maior preocupação dos parlamentares é que a destinação do terreno atenda ao interesse social e seja definido de acordo com as demandas locais. “A região Noroeste abriga mais de 300 mil pessoas e é considerada a mais populosa da cidade. Essa região apresenta uma carência de áreas verdes e de lazer. O que impõe uma importância ainda maior para aliar ao futuro uso do terreno o desenvolvimento social e econômico da região, com atividades relacionadas a cultura, esporte, educação e proteção do meio ambiente”, defende o deputado Rogério Correia.

Financeiramente deficitário e rejeitado pela população por oferecer riscos de acidentes em área urbana e residencial, o aeroporto está sob promessa de encerramento das atividades há quase um ano. Sob a linha de decolagem, os moradores do entorno do aeroporto temem pela segurança e não sem razão. Nos últimos anos, vários acidentes ocorreram na região envolvendo aeronaves que decolaram do Carlos Prates. Vários deles com vítimas fatais. Depois de tantos anos convivendo com o risco de morte, a população da Regional Noroeste espera que agora o aeroporto se transforme num espaço de vida, cultura e lazer.

Relembre os acidentes aéreos

A convivência da população com o Aeroporto Carlos Prates foi se tornando insustentável ao longo dos anos e chegou ao limite em 2019, quando duas aeronaves caíram na Rua Minerva, no Bairro Caiçara. Os acidentes causaram a morte de cinco pessoas, sendo duas delas de moradores que estavam em um veículo atingido por um dos aviões. Outras duas quedas envolveram tentativas de pouso no aeroporto em 2014. Em uma delas, o monomotor atingiu o telhado de uma casa próxima à Avenida Pedro II e feriu duas pessoas. Em outra, o avião atingiu um muro na marginal do Anel Rodoviário. Veja o histórico dos acidentes.

Abril de 2019 – Uma aeronave de pequeno porte caiu na Rua Minerva. A aeronave bateu no portão de uma casa e pegou fogo. O piloto morreu carbonizado.

Outubro de 2019 – Uma aeronave caiu sobre carros no Bairro Caiçara, A queda, que ocorreu na Rua Minerva, entre as ruas Nadir e Rosinha Sigaud, deixou cinco mortos e três feridos.

Junho de 2015 – Um avião de pequeno porte caiu em cima de uma casa no Bairro Minaslândia, Região Norte. O acidente ocorreu na Rua São Sebastião, próximo à estação de metrô Primeiro de Maio. O piloto, copiloto e um tripulante morreram na queda.

Novembro de 2014 – Um avião caiu e deixou duas pessoas feridas no Bairro Jardim Montanhês. A aeronave atingiu o telhado da residência, próximo à Avenida Pedro II. o piloto do monomotor e o passageiro sofreram ferimentos leves e foram socorridos por vizinhos do local do acidente.

Dezembro de 2014 – Um avião de pequeno porte caiu na marginal do Anel Rodoviário, em Belo Horizonte. A aeronave perdeu altitude quando iria tentar pousar no aeroporto Carlos Prates e bateu no muro de uma empresa.

Maio de 2012 – Um avião de pequeno porte caiu em um barranco próximo à cabeceira da pista do Aeroporto Carlos Prates. A aeronave apresentou problemas mecânicos logo após o pouso e o piloto não conseguiu parar o equipamento a tempo.

Agosto de 2012 – Um helicóptero AS 50 Esquilo caiu na cabeceira do Aeroporto Carlos Prates. O piloto e um aluno ficaram feridos. Por pouco não ocorreu uma tragédia, pois a queda aconteceu a cerca de 30 metros do Anel Rodoviário.