Reforma da previdência pode aumentar desigualdades
Maioria entre desempregados e no mercado informal de trabalho, mulheres seriam as principais atingidas pelas mudanças.
A reforma da previdência proposta pelo governo federal, comandado por Jair Bolsonaro (PSL), vai aumentar as desigualdades sociais e as justificativas utilizadas para legitimar as mudanças são mentirosas: essa é a opinião das convidadas de audiência pública na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), na manhã desta segunda-feira (27/5/19). A reunião, realizada pela Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher.
As convidadas salientaram que, se a reforma for aprovada, todas as desigualdades serão ampliadas, sejam elas de classe social, de gênero ou de raça. A coordenadora nacional do Movimento Negro Unificado, Ângela Maria da Silva Gomes, apresentou dados que evidenciam que as mulheres são maioria no mercado informal de trabalho, o que dificulta que elas alcancem o mínimo de 20 anos de contribuição, conforme determina a reforma.
Além de estarem mais na informalidade que os homens, elas são maioria entre os desempregados, problema que as assola ao longo da vida. “Nossa carteira de trabalho é cheia de buracos, somo as primeiras a sermos demitidas em situações de crise”, disse. Ainda de acordo com os dados mostrados por Ângela Gomes, a maioria das mulheres atualmente se aposenta por idade e aumentar a idade mínima de 55 para 62 anos as atinge diretamente.
A convidada também lembrou que é o trabalho doméstico das mulheres que supre as demandas que a previdência não cobre. Em outras palavras, são em geral elas que abdicam de trabalho remunerado para cuidar dos idosos em casa ou dos membros da família doentes ou com necessidades especiais. Assim, para Ângela, ao tirar delas o direito de se aposentar, a precariedade de vida de toda a família será afetada.
Ângela Maria salientou que as mulheres abdicam de trabalho remunerado para cuidar dos idosos em casa – Foto: Clarissa Barçante
Além de criticar as novas regras propostas para conseguir aposentadoria, a convidada apontou que as mudanças sugeridas para as formas de cálculo também serão alteradas. No lugar de calcular o valor devido a partir de 80% dos salários mais altos, serão utilizados todos os salários ao longo da vida, o que vai reduzir o valor das aposentadorias.
Ela lembrou que a proposta também desvincula as aposentadorias da inflação ao retirar a obrigatoriedade do reajuste dos valores e isso, a médio e longo prazos, vão levar à redução dos benefícios.
Capitalização já está sendo revertida em outros países
O modelo de capitalização proposto também foi criticado por Ângela Gomes e por todas as presentes. A deputada federal Fernanda Melchionna (Psol/RS), presidente da Subcomissão Especial de Seguridade da Câmara Federal, destacou que dos 30 países do mundo que adotoram o modelo, 18 já estão voltando atrás.
Segundo ela, no Chile, que tem sido apontado por apoiadores do governo federal como modelo para a reforma da previdência no Brasil, 90% dos aposentados hoje recebe menos do que o salário mínimo, já na Colômbia e no México, que mantêm regimes mistos de previdência, sete em cada 10 idosos não conseguem acessar a renda previdenciária.
Outra preocupação apresentada pela deputada federal é com a retirada de status constitucional de 40 itens conforme previsto no projeto. Ao retirar os direitos da Constituição, o governo federal terá, como explicado pela parlamentar, mais facilidade para suprimí-los posteriormente, já que são necessários menos votos para mudanças infraconstitucionais.Mulheres negras temem impacto negativo da reforma da Previdência para as afro-descendentes
Por fim, ela fez coro também com as outras convidadas e disse que a campanha do governo federal que alega ser uma proposta de combate aos privilégios é mentirosa. “Dizem que se a reforma não passar, o Brasil vai quebrar. Isso é mentira”, disse Fernanda Melchionna.
As convidadas falaram que para cortar privilégios é preciso acabar com isenção de impostos de empresas como a Vale, taxar lucros e dividendos e aumentar os impostos sobre heranças. “O tal deficit fiscal que existe não é resultado dos direitos sociais e sim de crises internacionais, de apostas equivocadas em isenção de impostos para agrotóxicos que nos envenenam. A Vale, em Minas Gerais, não paga ICMS e ainda mata nosso povo. É dessas escolhas que vem o rombo, não dos nossos direitos”, disse a vereadora de Belo Horizonte Bella Gonçalves (Psol).
A deputada Marília Campos (PT) lembrou, ainda, que a aposentadoria especial de deputados acabou em Minas Gerias desde a Lei Complementar 140, de 2016, originada em projeto de lei de sua autoria. “É bom reforçar isso para que as pessoas entendam que não queremos privilégios, queremos justiça social”, disse defendendo que a Câmara também acabe com a aposentadoria especial dos parlamentares federais.
BPC – Uma das convidadas falou em especial do Benefício de Prestação Continuada, o BPC, um dos pontos mais polêmicos da proposta federal. Para a coordenadora da Ocupação Vitória Nilce de Paula, que é beneficiária do BPC, a reforma vai reduzir o valor recebido, que já é baixo para manter, no caso dela, uma família com uma criança especial.
Além disso, ela ressalta que a proposta coloca o teto de um beneficiário por família, de forma que impede que mães de duas ou três crianças especiais recebam para suprir as necessidades de todas elas.
Nilce de Paula destacou ainda a proposta de que o PIS seja pago apenas para quem recebeu até um salário mínimo por mês. “Se você fez hora extra para comprar um remédio no mês e seu salário passou um real do mínimo, não vai receber o PIS referente àquele mês”, disse sobre o benefício que atualmente é pago para aquelas que recebem até dois salários mínimos.
A deputada Andréia de Jesus lembrou que muitos municípios mineiros dependem das aposentadorias para manter o comércio local e que as consequências da reforma para o estado serão grandes.
Fonte: ALMG, em 27/5/2019.