Famílias extremamente pobres não conseguem pagar nem mesmo uma cesta básica, mostra relatório
Pesquisa encomendada pela Secretaria de Desenvolvimento Social, Trabalho e Segurança Alimentar de Contagem, realizada pela Fundação João Pinheiro (FJP), revela aumento da pobreza e da fome. O crescente número de pessoas em situação de vulnerabilidade social e de insegurança alimentar tem levado o município à proposição de diversas políticas públicas voltadas para essa população.
O foco do documento produzido pela FJP é o município de Contagem. No entanto, essa situação integra um quadro nacional de empobrecimento da população e consequente volta da fome ao país.
De acordo com os autores do levantamento, dois fatores podem explicar esse cenário. O primeiro são as políticas de austeridade financeira implementadas no governo federal desde 2014. Tais medidas foram acentuadas, a partir de 2016, com a Emenda Constitucional 95, apelidada de emenda do “teto de gastos”. Em razão dessa lei, o governo federal se exime de realizar investimentos em políticas sociais com a justificativa de que não é permitido gastar valores superiores ao do ano anterior.
O segundo fator é o quadro de desigualdade social, que se aprofundou em razão da insuficiência das políticas públicas federais e estaduais, que se agravou, depois de março de 2020, com a chegada da pandemia. “A situação do Brasil reflete a situação dos municípios, entre eles Contagem, onde a insegurança alimentar atinge grande parte da população”, pontua o relatório.
Indicadores da pobreza
Os indicadores de pobreza do Ministério da Cidadania utilizados no relatório são de 2021. Até o ano passado o órgão considerava pobres aqueles que ganhavam menos de R$ 178 mensalmente. Os quem sobreviviam com menos de R$ 89 por mês eram caracterizados como extremamente pobres. Pela pesquisa da FJP, há 38,9 mil famílias pobres ou extremamente pobres em Contagem. Os mais jovens predominam, com idade entre 25 e 34 anos.
Conforme a FJP, uma família extremamente pobre, de quatro pessoas tem um rendimento de R$ 356 mensais e enfrenta severo grau de fome. Isso porque o valor de uma cesta básica, de R$ 598 (preço de 2021), é superior à renda total dessa família em 68,19%. Uma família pobre com quatro integrantes aufere cerca de R$ 712 mensalmente. 84% desse valor se destinaria à compra de uma cesta básica.
É bom lembrar: hoje a cesta básica em Belo Horizonte está custando cerca de R$ 645, de acordo com a Faculdade de Economia da UFMG. Não há dados específicos sobre o valor da cesta básica em Contagem. No entanto, presumindo que os preços por ali não sejam muito distintos daqueles encontrados na capital, é razoável a suspeita de que o cenário contagense esteja se agravando.
Os autores do trabalho inferem que 316 mil cidadãos em Contagem podem estar vivendo com algum grau de insegurança alimentar. Isso corresponde a 47% da população.
O relatório da FJP ainda constata que o município é a terceira maior economia do estado, beirando os R$ 30 bilhões. O PIB por pessoa equivaleria, portanto, a R$ 45,8 mil. Isso corresponderia a uma renda aproximada de R$ 3,8 mil mensalmente para cada cidadão de Contagem.
Entretanto, como visto, a realidade é outra. Informações do IBGE, citadas no relatório, mostram que somente 32% da população trabalha, seja no mercado formal ou informal. E a renda média apenas dos trabalhadores do setor formal (onde, geralmente, há os maiores rendimentos) é de R$ 2,4 mil por mês. O grande número de pessoas que não possuem rendimentos ou que não recebem o suficiente para custear nem mesmo sua sobrevivência é um forte indicador da desigualdade existente na região.