Estado de Minas posterga pagamento de R$ 22,8 bilhões e educação e saúde são as áreas mais prejudicadas
Por: Assessoria de Monitoramento dos Poderes Públicos – 24/05/2023
O estado de Minas acumula uma despesa de R$ 22,8 bilhões, chamada de restos a pagar. Tal dívida se refere a despesas contraídas e não pagas no mesmo ano. Em 2022, essa quantia corresponde a quase três vezes o que o estado arrecadou com o IPVA.
Embora seja uma prática legal, disciplinada pela lei 4.320 de 1964, trata-se de algo preocupante, uma vez que os restos a pagar podem impedir que o orçamento do ano presente seja exequível. Chama a atenção ainda o fato de saúde e educação serem as áreas que mais concentram despesas não pagas, apesar de, constitucionalmente, terem recursos garantidos.
R$ 22,8 bilhões é o valor acumulado ao longo dos anos em restos a pagar e se refere aos três Poderes. Embora legalizada, essa prática orçamentária deveria ser excepcional. Por essa razão, a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101 de 2000) tenta limitá-la para impedir que o abuso no acúmulo dessa dívida comprometa orçamentos futuros.
Conforme a norma da responsabilidade fiscal, não pode haver novos restos a pagar nos últimos oito meses do mandato dos chefes dos Poderes. No caso de Minas Gerais, segundo o Relatório Resumido de Execução Orçamentária, os três Poderes empenharam em restos a pagar, apenas em 2022, R$ 4,8 bilhões. O ano passado foi o fim do primeiro mandato do governador Romeu Zema (Novo), bem como do ex-presidente da Assembleia Legislativa, Agostinho Patrus (PSD).
É importante pontuar que esses valores não se referem à dívida pública. Os restos a pagar são despesas cotidianas não quitadas, enquanto a dívida é relativa a empréstimos. Não obstante, o fato de que as parcelas da dívida deixaram de ser pagas em razão de decisões judiciais contribui para o aumento dos restos a pagar. Isso ocorre porque as parcelas não pagas também entram nessa conta.
A Lei de Responsabilidade Fiscal diz que o teto dos restos a pagar é a disponibilidade financeira para o pagamento deles. De acordo com o Relatório de Gestão Fiscal, a disponibilidade de caixa seria, somente para os restos a pagar do Executivo, R$ 882,9 milhões. No entanto, o mesmo documento aponta que, somente o Executivo também, em 2022, tem R$ 4,069 bilhões em restos a pagar sem disponibilidade financeira. Logo, o limite imposto pela lei não está sendo cumprido.
O fato de que, somente no ano passado, os três Poderes tenham postergado o pagamento de R$ 4,8 bilhões em despesas cotidianas, como já mencionado, significa que, o Estado já iniciou 2023 com essa dívida, agora acrescida às despesas desse ano. Portanto, a execução do orçamento estadual já se mostra comprometida. Tal pendência do ano anterior pode impedir ou, pelo menos, criar dificuldades adicionais para a execução de novas políticas públicas.
Os números apresentados sugerem haver uma inconsistência no discurso do governo mineiro. Matéria divulgada pela Agência Minas, portal de notícias do Executivo estadual, informa que houve um superávit em 2022 de R$ 2,2 bilhões. A arrecadação teria então superado as despesas. “Só alcançamos esse resultado porque fizemos uma gestão de verdade. Com respeito aos recursos públicos, sem mordomias, e buscando aumentar arrecadação com atração de investimentos. Não fizemos nenhum aumento de imposto, concedemos reajuste ao funcionalismo e melhoramos os serviços públicos, que é a principal missão do Estado. Só com compromisso fiscal é possível termos recursos disponíveis para ações que melhorem a vida do mineiro”, disse o governador Romeu Zema.
Cotejados os dois números, no entanto, dever-se-ia constatar um déficit bilionário que parece estar sendo mascarado, por meio de um estratagema contábil. Ainda que, numa leitura favorável, a prática de deixar restos a pagar possa estar dentro da legalidade e que, por alguma tecnicalidade, ela não esbarrasse nas restrições da Lei de Responsabilidade Fiscal, dificilmente haveria o que celebrar nesse saldo.
Saúde e educação são as áreas com mais restos a pagar
Educação e saúde possuem um percentual da arrecadação fixado que lhes garantem os recursos necessários. Portanto, em princípio, não deveria haver a postergação de despesas, o que possibilitaria a cada ano haver novos investimentos nesses setores. Os estados não podem aplicar menos de 25% da arrecadação de impostos em educação e, para a saúde, são 12%.
Contudo, em Minas Gerais, estão inscritos em restos a pagar, na área da saúde, R$ 6,3 bilhões no acumulado dos anos. Também há R$ 2,5 bilhões inscritos em restos a pagar na área da educação. Essas são informações publicadas no Portal da Transparência.
Na educação, a despesa mais postergada nos últimos tempos foram os auxílios às prefeituras e às entidades sem fins lucrativos. Essas instituições aguardam do estado R$ 658,2 milhões. Na saúde, as contribuições do estado aos fundos de prefeituras englobam as maiores despesas não pagas, como consta no Portal da Transparência.
Redação: Claudemir Francisco Alves e Marcelo Gomes