Projeto Eleições 2008 – Arquidiocese de Belo Horizonte

BOLETIM 1 – FEVEREIRO – 2008

FÉ E POLÍTICA: UMA MISSÃO POSSÍVEL? 

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A Arquidiocese de Belo Horizonte oferece, a partir de hoje, uma série de oito boletins que nos ajudarão  no entendimento do processo das eleições municipais deste ano. A Igreja acredita que a participação de eleitores bem informados contribuirá para que as eleições municipais sejam um passo importante na construção de uma sociedade mais justa, pacífica e harmoniosa.

Muita gente diz: “votar pra quê? A gente vota, muda prefeito, muda vereador, mas parece que pouca coisa muda… Veja só: no meu bairro, a Prefeitura construiu um centro de saúde todo bonito, mas até hoje praticamente não tem médico atendendo. Só funciona pra vacinação e olhe lá… Já reclamamos com um vereador que se diz representante do bairro, mas ele só dá desculpa esfarrapada… Eu voto porque é obrigatório…” Essas pessoas desanimam da política quando vêem coisas mal feitas. Mas nós não desanimamos! Ao contrário: o que estiver ruim, pode ser consertado; o que estiver bom, pode ficar ainda melhor!

Este boletim foi escrito por pessoas que vêem a política como uma “forma sublime de praticar o amor ao próximo” e que estudam a realidade, buscando caminhos para melhorar nossa sociedade. A participação consciente do maior número possível de cidadãos é o caminho mais eficaz para construir no País uma verdadeira Democracia: política, social, cultural, étnica e econômica.

POLÍTICAS PÚBLICAS

Vamos começar falando da participação da sociedade na definição das políticas públicas. Sua história começa há quase 800 anos. Isto mesmo: em 1215, quando os nobres da Inglaterra se revoltaram contra os altos impostos cobrados pelo rei. Para conter a revolta, o rei assinou a Magna Carta que, entre outras concessões de ordem jurídica (como o habeas corpus) e política (submissão do rei às normas da lei), instituiu o controle dos impostos por um Conselho de Barões. Até então, o poder do rei era absoluto: obrigava seus súditos a pagarem impostos e usava o dinheiro arrecado como bem quisesse. A partir daí, ele só poderia cobrar impostos com autorização do Conselho que dizia em quê o dinheiro deveria ser usado. Naquela época nem se pensava em participação democrática, do povo todo. Somente os nobres tinham assento no Conselho do Reino. Mas ali foi lançada a semente do Estado Constitucional moderno.

Surpreendente, é que muita gente até hoje não entende que quem paga imposto tem direito a decidir sobre sua utilização. Os barões ingleses entenderam isso muito bem, mas reservaram esse direito para si. Só com muito tempo e muita luta política esse direito foi-se estendendo até o povo. Este é um dos desafios do Estado democrático: criar instrumentos que permitam a todo contribuinte decidir sobre o destino de seus impostos. Esta é uma das mais antigas conquistas da democracia: quem exerce o poder público (rei, presidente, ministro, prefeito) não é dono dos recursos arrecadados, mas sim uma espécie de gerente. Ele deve administrar a coisa pública, destinando os recursos conforme aquilo que foi decidido pelos cidadãos.

Aqui chegamos ao ponto-chave: todos pagamos impostos, queiramos ou não, porque os impostos sobre o consumo, por exemplo, incidem sobre qualquer coisa que se compre. Mas pouca gente, muito pouca gente, decide sobre o destino a ser dado aos impostos, isto é, em quê e como eles devem ser gastos.

Decidir sobre o destino que deve ser dado aos recursos arrecadados pelos impostos é uma das principais atribuições de quem faz política. Essa decisão cabe, em última instância, às pessoas que nós mesmos escolhemos para, em nosso nome, decidir sobre quanto gastar nas diversas áreas de interesse geral da população. Em outras palavras, elegemos governantes e legisladores para usarem o dinheiro dos impostos arrecadados em políticas públicas.

Todas as medidas e disposições governamentais que atingem a sociedade, influenciando as condições de existência dos cidadãos, são chamadas de políticas públicas. Elas podem afetar os mais diversos setores da vida coletiva; por isso tratam da política econômica, ambiental, previdenciária, industrial, de segurança, de telecomunicações, tecnológica, prisional, cultural, energética, de relações internacionais, educacional, de saúde, monetária e outras. Algumas só podem ser definidas em âmbito federal (p.ex. defesa nacional) ou estadual (p.ex. segurança pública), mas as mais próximas do nosso dia-a-dia – as políticas sociais : ensino fundamental, saúde, lazer, transporte urbanos, saneamento e abastecimento de água etc-, são definidas pelos poderes municipais. Daí a importância das eleições deste ano: nelas escolheremos quem vai definir os rumos das políticas públicas no município onde vivemos.

 

IMPORTÂNCIA DA PARTICIPAÇÃO

Ao produzir e distribuir este boletim, a Igreja está convidando você e todas as pessoas de boa-vontade, para unirmos nossas forças e, com entusiasmo e esperança, influirmos positivamente nas eleições municipais deste ano. Não se trata de indicar partido nem candidatos, mas sim de colaborar para a construção de um município mais justo, harmonioso, pacífico e ecologicamente equilibrado. Queremos assim realizar a vocação dos “discípulos e missionários” de Jesus que se colocam a serviço do Reino de Deus – e isso significa, em sua dimensão política, uma sociedade conforme a promessa bíblica:

Amor e fidelidade se encontram, justiça e paz se abraçam. A fidelidade brotará da terra, e a justiça se inclinará do Céu“ (Salmo 85 (84).”

Para aproveitar bem este material, de modo a participar das próximas eleições não apenas como uma obrigação, mas como uma contribuição consciente para melhorar o município, sugerimos o seguinte:

  • Leve este boletim e convide outras pessoas de seu relacionamento para também lerem e juntos debaterem o tema proposto.
  • Reflitam juntos sobre a relação entre o dever de pagar imposto e o direito de votar.
  • Se o grupo achar que foi proveitoso, marque nova reunião dentro de um mês, para a leitura e o debate sobre o tema do próximo boletim.

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BOLETIM 2 – MARÇO- 2008

POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIAIS PARA O CIDADÃO

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Da janela da minha cidade, enxergo o mundo

Carlos Drummond de Andrade

No boletim de fevereiro falamos sobre a importância da participação de todos os cidadãos e cidadãs na definição das políticas públicas. Muitas pessoas, porém, dizem “Que diferença eu posso fazer, se o centro das decisões está tão longe de nós? Será que minhas opiniões e reivindicações serão ouvidas no Congresso, ou no Palácio do Planalto?” De fato, a grande imprensa privilegia as notícias nacionais, dando a impressão de que somente em Brasília são tomadas as decisões políticas. Mas aí reside um engano. Também na nossa cidade são tomadas decisões importantes. Não por acaso temos o conceito de “município”, que era o nome dado, na Roma antiga, às cidades que tinham o privilégio de se governarem a si próprias.

O artigo 29 da nossa Constituição prevê que cada município deve ser regido por sua própria Lei Orgânica, desde que respeite as Constituições Federal e Estadual.

Não poderia ser de outro jeito, pois é nos municípios que a gente mora, trabalha, estuda, educa os filhos, faz compras, se diverte, busca atendimento de saúde, coleta lixo e trata água e esgoto, precisa de iluminação pública, transporte, segurança e todos os serviços necessários à vida cotidiana. É o município que tem significado concreto no dia-a-dia das pessoas. Quando saímos de casa e chegamos à rua, sabemos que estamos em Minas e no Brasil, mas o que realmente sentimos é a cidade (ou a comunidade rural) onde moramos.

Por tudo isso, é na política de nosso município que começa a participação cidadã. Isso não quer dizer somente votar, mas se interessar, compreender e se posicionar no processo político local, inclusive participando de uma campanha eleitoral ou de comitê contra a corrupção eleitoral. Pouco adianta reconhecer pela fotografia os políticos da nossa cidade, se não sabemos a quais grupos estão ligados, quais interesses representam ou quais têm sido suas lutas políticas.

Começando de perto de nossa casa, influenciaremos também na política nacional. Uma liderança municipal pode projetar-se politicamente em âmbito estadual e federal, lutando por nossos direitos e reivindicando em favor de nossas causas, de modo a integrar as lutas municipais às grandes causas nacionais. As lideranças locais que são fiéis às suas origens levam a voz de seus concidadãos até os mais distantes centros de poder. Por isso se diz, com toda razão que devemos pensar globalmente e agir localmente”.

O município

É isso! Agir no local onde vivemos é participar em movimentos e associações de bairro, na comunidade, na Igreja, em grupos de ação social, associações profissionais, sindicatos ou partidos, mas tendo um horizonte muito mais amplo. Não dá para olhar somente para os problemas da nossa comunidade, nosso bairro ou nosso município. Afinal, vivemos um tempo de globalização e o que acontece no outro lado do mundo pode ter consequências diretas em nossa vida. Basta lembrar a questão ecológica.

Um dos maiores problemas do mundo de hoje é o descuido com a ecologia. Seus sintomas são o aquecimento global, a poluição das águas e do ar, a perda da biodiversidade, a exaustão do petróleo, a acumulação do lixo na terra e no mar, a desertificação e a perda da capacidade de auto-regeneração da vida. Dentro de mais duas ou três décadas a Terra entrará em crise, gerando muitas convulsões sociais, a menos que haja uma radical mudança na estrutura produtiva e nos padrões de consumo da Humanidade. Por isso, a agressão à natureza deve ser encarada como uma ameaça à paz mundial.

As medidas que poderiam corrigir esse problema são barradas por empresas (para não diminuírem seus lucros), por países como China, Índia, Rússia e Brasil (que querem crescer rapidamente) e principalmente pelos Estados Unidos e outros países ricos (para não diminuir o nível de consumo). Diante desses gigantes globais, o movimento ecológico sente-se como o menino Davi diante de Golias: sua arma é apenas a consciência planetária. Cada dia aumenta o número de pessoas que buscam inovações como a economia solidária, preferem a produção local (que evita o custo ambiental do transporte), e aceita padrões de consumo mais simples para não prejudicar o meio-ambiente. Essa consciência de que somos todos responsáveis pela vida do nosso planeta rejeita a idéia de um progresso material sem limites e resgata o sentido da criação, pois

Deus tomou o homem e o colocou no Jardim do Édem, para que o cultivasse e guardasse”. (Gn 2,15)

ECOLOGIA

Na Conferência de Aparecida, os bispos católicos da América Latina e Caribe pronunciaram-se sobre esse tema: “como profetas da vida, queremos insistir que nas intervenções humanas sobre os recursos naturais não predominem os interesses de grupos econômicos que arrasam irracionalmente as fontes de vida, em prejuízo de nações inteiras e da própria humanidade. As gerações que nos sucederem têm direito de receber um mundo habitável, e não um planeta com ar contaminado, águas envenenadas e recursos naturais esgotados”.

Sintonizados com esse desafio, voltemos para a realidade local: nosso município e nossa comunidade são a base do processo das necessárias transformações sociais, econômicas e políticas em escala mundial. Esse processo vai desde pequenos, mas importantes gestos de respeito ao meio-ambiente – como não desperdiçar água e energia e reciclar o lixo – até a definição e execução de uma política ambiental de âmbito nacional, continental e global. Mas uma política ambiental começa no município. Assim, fica a pergunta:

  • O que significa agir localmente e pensar globalmente para uma política ambiental eficaz?
  • Como você vai celebrar o Dia da água (22 de março) e do Meio-ambiente (5 de junho)?
  • O que isso tem a ver com uma eleição municipal?

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BOLETIM 3 – ABRIL- 2008

A PARTICIPAÇÃO DO CIDADÃO NA GESTÃO PÚBLICA

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Abrimos esta série de boletins falando de políticas públicas: os procedimentos governamentais que influenciam as condições de existência dos cidadãos. Há políticas de competência exclusiva da União, como o controle da moeda e a defesa nacional, e outras de competência dos Estados, como a segurança pública. Ao município cabe tomar as medidas que afetam diretamente nosso dia-a-dia. É sobre elas que refletiremos aqui, para apontar as formas de participação da população em sua formulação e execução.

Respeitadas as diretrizes determinadas pela União e pelo Estado, cabe ao município definir e executar as ações referentes ao ensino fundamental, saúde, lazer, ocupação urbana, transporte municipal, coleta e tratamento e lixo, saneamento e abastecimento de água. Cabe então perguntar como são definidas essas ações. Quem decide o que será feito? Pode-se garantir que os recursos públicos serão corretamente aplicados? Quem tem o poder de fiscalizar o cumprimento do que foi programado?

O sistema político brasileiro por muitos anos atribuiu a definição das ações ao Poder Executivo (o prefeito e os secretários por ele nomeados) e sua fiscalização ao Poder Legislativo (vereadores e vereadoras) e aos Tribunais de Contas (estaduais e da União). Nesse sistema, após eleger o prefeito e os vereadores, a população ficava sem meios de participar nas decisões: não opinava nem acompanhava a execução das políticas publicas. Esse sistema favorecia o tráfico de influências, a troca de favores e, no limite, a corrupção. Pois quanto mais distante fica o povo, mais facilmente se instalam os vícios da “politicagem”.

Foi para mudar esse sistema que a Constituição de 1988 estabeleceu instrumentos de participação da sociedade nas ações governamentais e na sua fiscalização. Este é um dos motivos pelos quais ela ficou conhecida como “Constituição Cidadã”. O problema é que as inovações constitucionais ainda não entraram na cultura do povo, que em sua maioria continua pensando e agindo como se vivêssemos sob a antiga Constituição. É preciso, então, traduzir em prática popular as conquistas cidadãs garantidas por nossa Lei Maior. Só assim teremos políticas públicas voltadas efetivamente para o bem de todos, principalmente os que mais precisam.

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Apesar de a Constituição ter sido aprovada há quase 20 anos, só agora a população começa a ver na prática suas inovações. Estamos aprendendo a recorrer ao Ministério Público, tivemos em 2005 a experiência de um referendo (sobre o comércio de armas) e em 1989 fizemos um plebiscito para escolher entre monarquia parlamentar e presidencialismo. Tivemos também aprovado um projeto de lei de iniciativa popular contra a corrupção eleitoral (lei 9.840), de que falaremos noutro boletim. Mas nem todos sabem que a população pode propor leis nas Câmaras Municipais, desde que tenham um número mínimo de assinaturas fixado pela Lei Orgânica de cada município.

Importantes, também, são os Conselhos de Cidadania ou de Direitos, órgãos compostos por representantes do governo e da sociedade civil. A sociedade participa por meio de entidades organizadas (sindicatos, associações, movimentos sociais, ONGs…) que devem indicar seus representantes. Por meio deles, a sociedade participa da gestão pública fiscalizando, apresentando demandas, elaborando políticas públicas e até diretrizes de ação para o governo. Os Conselhos podem ser municipais, estaduais e nacionais e atingem diversas áreas sociais, sendo alguns obrigatórios. Em âmbito municipal, existem os Conselhos de Segurança Alimentar, Saúde, Criança e Adolescente, Assistência Social, Segurança Pública, Direitos Humanos, Educação, Direitos da Mulher, Igualdade Racial, Idoso, Meio-Ambiente, Pessoa Portadora de Deficiência, Juventude, além de outros nas áreas de desenvolvimento econômico e da cultura.

Os Conselhos são canais por onde passa a vontade popular na elaboração da agenda governamental. Quando funcionam bem, asseguram a eficiência das políticas públicas, impedem que o interesse privado prevaleça sobre o interesse público e tornam-se uma verdadeira escola de democracia. A sabedoria dos antigos já ensinava isso:

”Escolha entre o povo homens capazes e tementes a Deus, que sejam seguros e inimigos do suborno: estabeleça-os como chefes de mil, de cem, de cinqüenta e de dez. Desse modo, vocês repartirão a tarefa e você poderá realizar a sua parte.” (Ex 18, 21,23)

Outro mecanismo de participação da sociedade na gestão governamental é o Orçamento Participativo. Embora não esteja previsto na Constituição Federal, ele foi criado em Vila Velha-ES há mais de vinte anos e depois de seu êxito em Porto Alegre-RS, disseminou-se pelo Brasil como forma de participação popular na definição do orçamento municipal. Em sua base, estão as assembléias periódicas, abertas a todos, em todos os bairros e distritos, tendo na pauta temas específicos. Qualquer cidadão pode pronunciar-se sobre como a prefeitura deve aplicar os recursos do orçamento destinados aos investimentos. Certos municípios, como Belo-Horizonte, adotaram consultas também pela internet. As assembléias elegem delegados para negociarem com o governo. Eles formarão um Conselho anual que deve dialogar diretamente com os representantes da prefeitura sobre a viabilidade das obras aprovadas nas assembléias. Podem propor, também, mudanças nas regras de funcionamento do Orçamento Participativo e definir as prioridades dos investimentos.

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Já que a experiência está dando certo, o desafio agora nos municípios onde já se pratica o Orçamento Participativo é aumentar a participação popular, criando mecanismos mais eficazes de acompanhamento e de cobrança. Nos outros municípios (que são a maioria), cabe à sociedade local se mobilizar e pressionar vereadores e prefeito, a fim de que seja implantada essa forma de participação cidadã.

Para os cristãos, há um outro desafio especial. Em sua visita ao Brasil, Bento XVI referiu-se à Igreja como “advogada da justiça e dos pobres”. Isso significa que nossa participação não deve ser apenas para defender os interesses do nosso bairro ou dos setores aos quais estamos ligados, mas deve ter sempre presente o imperativo da justiça e o atendimento aos setores mais carentes da sociedade.

  • Você participa ou já participou de algum Conselho de Cidadania? Ou de uma assembléia de Orçamento Participativo? Se sim, transmita sua experiência a outras pessoas. Se não, procure informar-se com quem tem participado.

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BOLETIM 4 – MAIO- 2008

ATRIBUIÇÕES DOS PODERES EXECUTIVO, LEGISLATIVO E JUDICIÁRIO

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Aproximando-se o momento em que estarão nas ruas as campanhas para a eleição de prefeito e vereadores, é hora de refletirmos sobre o que se deve esperar dos candidatos e candidatas.

Conforme a tradição democrática, a Constituição do Brasil reconhece três Poderes: Executivo, Legislativo e Judiciário. A divisão dos poderes é um dos pilares da democracia, porque impede que o poder se concentre nas mãos de um único mandante (ditador). Os três Poderes devem ser independentes – um não pode interferir no funcionamento do outro –  mas devem funcionar em harmonia.

Ao Poder Executivo cabe governar, administrando os recursos públicos conforme determina a lei. Seus chefes, respectivamente o presidente da República, o governador de Estado e o prefeito no Município, não governam sozinhos, pois nomeiam ministros ou secretários para a execução das políticas públicas de sua área. Eles são responsáveis pela atividade dos organismos e dos servidores públicos.

O Poder Legislativo é representado, em nível federal, pelos deputados federais e senadores (o Congresso Nacional), em nível estadual, pelos deputados estaduais (Assembléias Legislativas) e nos municípios, pelos vereadores (Câmaras Municipais). São parlamentares cuja atribuição constitucional é de legislar e fiscalizar. Devem propor e votar leis, apreciar matérias apresentadas pelos outros Poderes e pela população, fiscalizar as ações do Executivo, votar os orçamentos apresentados por ele e examinar suas contas. Podem, ainda, em situações específicas, julgar membros do próprio Legislativo e do Executivo.

O terceiro poder é o Judiciário, que só existe em nível federal e estadual e tem como base a comarca. Ele não faz leis, mas compete-lhe interpretar as leis e julgar as pendências. Seus membros, os juízes e promotores, são escolhidos por concurso público, mas desembargadores, nos Estados, e os ministros dos Tribunais superiores são nomeados pelo Governador e pelo presidente da República, respectivamente.

Vamos nos ater aqui aos poderes municipais, pois nas próximas eleições vamos escolher quem vai exercê-los em nosso nome.

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A tradição política popular atribui ao prefeito mais poder do que ele de fato pode ter. Do prefeito se esperam respostas a todos os problemas locais, mesmo que estejam fora de suas atribuições, como é o caso da segurança pública – que é atribuição do Estado e da União. Dele é esperado também que se aproxime do povo, ouça as lideranças e organizações comunitárias e esteja atento às necessidades da população carente.

Essas expectativas se inscrevem dentro do espírito cordial da cultura brasileira, mas com freqüência levam o prefeito a substituir suas obrigações legais por atitudes assistenciais e paternalistas. Ou seja, ele agrada o povo mas deixa de planejar, coordenar e controlar as políticas públicas municipais e pouco favorece a integração do município em âmbito estadual.

Tanto quanto o prefeito, os vereadores e vereadoras são de fundamental importância para o município, ainda que nem sempre isso seja reconhecido. A palavra vem do verbo “verear”, que no português arcaico estava associado a “cuidar de caminhos”. Essa expressão já era usada em Portugal em 1352, no sentido de governar um lugar, região ou localidade. Desde aquela época, vereador era a pessoa que tinha a incumbência de vigiar pela comodidade, bem-estar e sossego dos moradores, enfim, cuidar dos caminhos da administração. Daí também o sentido do vereador como o fiscal do povo em uma administração pública.

Aquele significado pode ser traduzido, hoje, nas funções constitucionais do vereador: legislar e fiscalizar. As Câmaras Municipais devem ter no mínimo sete vereadores, porque é necessário que haja o embate de idéias e o confronto de projetos, para que não prevaleça o pensamento do mais forte e sim a proposta com maior número de adeptos. Esta lógica é essencial para o processo político.

A bancada de vereadores da situação é formada pelos que defendem a administração e os projetos do Executivo, enquanto a bancada da oposição é formada pelos que buscam os erros e irregularidades na administração municipal. O confronto leal e honesto entre elas só traz benefícios ao município. O problema é que, muitas vezes, ambos os lados exageram em suas posições: a situação fecha os olhos para as irregularidades, defendendo a prefeitura a todo custo, enquanto a oposição faz uma crítica obstinada a tudo que venha do prefeito, dificultando assim a implementação de políticas que possam favorecer o município. Nos dois casos, quem perde é a população. Por isso, devemos estar atentos a este comportamento dos vereadores e cobrar para que em seus posicionamentos tenham como objetivo maior o bem-comum.

Enfim, cabe ao vereador exercer o papel de educador político: em sua função de organizar e mobilizar a sociedade desde as bases, ele deve lhes transmitir informações e conhecimentos que levem ao exercício pleno da cidadania na luta por seus direitos. Assim fazendo, ele ajudará outras pessoas a crescerem como lideranças na política local.

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Para concluir, uma reflexão: quanta distorção existe em nossa cultura política, que vê no vereador apenas uma “ponte” para encaminhar suas demandas junto ao Executivo! É como se ele tivesse sido eleito para abrir portas na Prefeitura… Mais grave ainda é ver no vereador quem pode conseguir os favores do prefeito e arrumar emprego, material de construção, cesta básica, consulta médica, asfalto para a rua, escola e outras obras para o bairro… Infelizmente, vereadores e prefeitos honestos, que se negam a fazer isso, correm o risco de não serem reeleitos. É preciso maior consciência política da população, para que os vereadores e prefeitos bem intencionados possam cumprir sua função, conforme o mandamento divino:

Não perverta o direito, não faça diferença entre as pessoas, nem aceite suborno, pois o suborno cega os olhos dos sábios e falseia a causa do justo.” (Dt 16,19)

Para concluir esta reflexão, sugerimos que você olhe a realidade do seu município e diga se seus vereadores cuidam dos caminhos do povo… Se não cuidam bem, ou se deveriam cuidar melhor, o que você pode fazer?

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BOLETIM 5 – JUNHO – 2008

ELEITOR CONSCIENTE NÃO ACEITA A CORRUPÇÃO

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Você ainda se lembra em quem votou para vereador em 2004? Se respondeu sim, parabéns! Pois as pesquisas mostram que a maioria dos eleitores não consegue responder a essa pergunta.

Ao votar em uma pessoa, transferimos para ela um poder que pertence a cada cidadão e cidadã. É como se passássemos uma procuração para que outra pessoa decida em nosso nome, por um período de quatro anos. Essa procuração é o mandato dado pela Justiça Eleitoral, em nome da população. Por isso, todo cidadão tem o direito de cobrar dos eleitos que cumpram os compromissos assumidos na campanha e que trabalhem de maneira ética e responsável. O problema é que muita gente não tem consciência do seu próprio poder político e acredita que o mandato é uma conquista dos candidatos vitoriosos, um prêmio que recebem para usarem à vontade. Vejamos as raízes históricas dessa alienação do poder cidadão.

Nos tempos do império, somente os homens livres, proprietários ou que provavam ter certa renda anual, podiam votar. A República ampliou o número de eleitores, mas até 1930 eles não chegavam a 5% da população total. Só em 1933 o direito de voto foi estendido às mulheres. Mas as pessoas analfabetas, soldados, cabos, índios e os jovens entre 16 e 18 anos só em 1988 conquistaram o direito de voto.

Felizmente, hoje o Brasil já tem mais de 100 milhões de pessoas legalmente aptas a votarem. É um grande avanço para a democracia, mas seria ingenuidade pensar que todas essas pessoas conhecem as regras jurídicas do processo eleitoral. No mês passado refletimos sobre as relações entre o Poder Executivo (prefeito e secretários) o Legislativo (vereadores). No próximo mês refletiremos sobre as regras das eleições proporcionais. Desta vez refletiremos sobre o problema da corrupção.

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A corrupção é um dos maiores inimigos do povo e da democracia. Infelizmente, ela existe por toda parte. Em nosso país suas formas mais frequentes são o clientelismo e a corrupção eleitoral. É preciso saber como funcionam, para que sejam denunciadas e eliminadas.

Os cargos políticos trazem muitas vantagens pessoais para quem os conquista. Além das vantagens legítimas, previstas por lei (como a boa remuneração, a imunidade parlamentar e a contratação de assessores) eles abrem possibilidade também para vantagens ilegítimas, decorrentes do uso do poder público para alcançar benefícios privados. Isso se dá, por exemplo, quando o Executivo contrata empreiteiras que praticam o superfaturamento ou que fazem obras com material de qualidade inferior ao previsto e embolsam a diferença. Depois dividem o lucro ilegal, seja como financiamento para a campanha eleitoral, seja como depósito fora do Brasil.

No caso de parlamentares, a forma mais usual de corrupção está na venda do voto para certos projetos de lei. Um exemplo: num bairro onde só são permitidas residências até quatro andares, uma empresa imobiliária quer construir grandes edifícios e tem grande interesse em ver aprovada uma lei que mude o plano diretor municipal. Alegando que o projeto favorecerá o desenvolvimento urbano, a maioria dos vereadores o aprovará, recebendo depois um apartamento cada um… Esta é uma forma de corrupção tão difícil de ser provada, que alguns parlamentares chegam a dizer, cinicamente, que “é dando que se recebe”… O profeta Jeremias assim descreveu esses políticos:

Como gaiola cheia de passarinhos, assim as casas deles estão de coisas roubadas. Eles se tornaram ricos e importantes, gordos e reluzentes. (Jr. 5, 27)

Políticos corruptos, que buscam vantagens ilegítimas nos cargos públicos, só conseguem alcançar seus propósitos encobrindo-os com falsas promessas ou comprando votos de pessoas que desconhecem o valor do seu voto. São como lobos cobertos por peles de ovelhas, que se aproveitam da necessidade econômica de muitos cidadãos honestos, para oferecerem benefícios de ordem material na certeza de que quem recebe tais benefícios só poderá retribuir com o voto nas eleições.

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Foi para combater eficazmente essa forma perversa de compra de votos, que em 1997 a Comissão Brasileira Justiça e Paz (organismo vinculado com a CNBB) lançou a proposta de “Combate à Corrupção Eleitoral”. Ela obteve a adesão de muitos grupos e organizações e conseguiu reunir mais de um milhão de assinaturas para o Projeto de Lei de Iniciativa Popular. Ela foi aprovada pelo Congresso Nacional e passou a vigorar como a Lei 9840, que pune a compra de votos com a perda do mandato.

Esta foi uma vitória importante na luta contra a corrupção eleitoral e os resultados são animadores: uma pesquisa divulgada em outubro de 2007 revelou que desde o ano 2000, ano da primeira eleição em que foi aplicada a Lei 9840, a Justiça Eleitoral cassou o mandato de 623 políticos acusados de compra de votos.

É claro que ainda há muitos passos a dar para eliminar a corrupção da cena política brasileira, pois ainda existe candidato que compra e eleitor que vende voto. O primeiro passo é a formação da consciência de que “voto não tem preço, tem consequência”. Cada voto é precioso, porque é a procuração que damos a alguém para nos representar no exercício do Poder Público e todos queremos ter dignos representantes. Outro passo importante é fazer que as denúncias de corrupção eleitoral cheguem ao Ministério Público. Para isso, o melhor instrumento de ação são os Comitês de Combate à Corrupção Eleitoral. Se houver pelo menos um comitê por município (nos municípios maiores é recomendável pelo menos um por zona eleitoral), só o medo de ser denunciado inibirá os políticos mal-intencionados.

Enfim, também na política vale a sabedoria do Evangelho: “pelos frutos, reconhecereis a árvore”: político que tem muito dinheiro para gastar na campanha, ou que distribui favores, certamente não é árvore boa porque, se for eleito, ele fará de tudo para recuperar tudo que tiver gastado na campanha… Convém estar atento aos candidatos que fazem doações para festas e eventos comunitários, oferecem faixas para festas religiosas, patrocinam torneios esportivos, facilitam consultas médicas e tratamento de dentes…

Após refletir sobre tudo isso, vai aqui um desafio: o que você fará este ano para combater a corrupção eleitoral?

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BOLETIM 6 – JULHO – 2008

A IMPORTÂNCIA DA CÂMARA DE VEREADORES

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No mês passado refletimos sobre o clientelismo e a corrupção eleitoral, apontando-os como uma ameaça à democracia. Agora vamos tratar do processo eleitoral propriamente dito. Vamos entrar no assunto fazendo uma pergunta que pode até parecer boba: você sabe qual o destino do seu voto? Muita gente pensa que o voto vai diretamente para o candidato, mas aí existe um “detalhe” ao qual é preciso ficar atento: a apuração dos votos em eleições majoritárias (como de prefeito) é muito diferente da apuração em eleições proporcionais (é o caso da eleição de vereadores).

Quando se trata de eleger prefeito municipal, os candidatos disputam uma única vaga, sendo eleito quem obtiver a maioria dos votos, por isso é uma eleição majoritária. Já nas eleições proporcionais os candidatos e candidatas disputam várias vagas (os municípios menores têm 7 vereadores, os maiores podem ter até 51). Aqui vem o “detalhe” que precisamos conhecer, para não nos deixarmos enganar por políticos espertalhões.

Para facilitar a compreensão do processo, tomemos como exemplo o município de Belo Horizonte, que em 2004 tinha 1.680.000 eleitores e 41 vereadores. Como 400.000 pessoas se abstiveram de votar ou votaram nulo, foram dados 1.280.000 votos para preencher as vagas na Câmara Municipal: aproximadamente 31.200 votos por vaga. Este é o “detalhe” que determina os eleitos: é o quociente eleitoral. (Como esse número varia de um município para outro, se você quiser conhecer o quociente eleitoral de outros municípios, acesse a página do TSE: www.tse.gov.br/eleicoes).

Pois bem, as vagas na Câmara Municipal não são preenchidas pelos candidatos com maior número de votos, e sim pelo total de votos dados aos candidatos do mesmo Partido (isoladamente ou coligados – mas, para simplificar, deixamos de lado a coligação). Ou seja, cada Partido soma a votação de todos os seus candidatos mais os votos na legenda. Se um Partido não alcançar o quociente eleitoral, não elegerá vereador e seus votos se “perdem”. Se tiver 31.200, elegerá um vereador, se tiver 2 x 31.200 elegerá dois, e assim por diante. Para preencher as últimas vagas, o número de votos necessários pode ser inferior ao quociente eleitoral. São as chamadas “sobras”, repartidas entre os Partidos que fizerem pelo menos um vereador.

É na distribuição das vagas a que tem direito o Partido, que valem os votos nominais. Se o Partido tiver direito a 3 vagas, serão eleitos os 3 candidatos mais votados do Partido, ficando os seguintes mais votados como 1º, 2º e 3º suplentes. No caso de Belo Horizonte, o vereador mais votado na última eleição, recebeu 20.157 votos; o menos votado, 3.685. Nenhum deles teve votação suficiente para alcançar o quociente eleitoral. Eles só foram eleitos porque foram beneficiados pelos votos de seu Partido.

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Esse sistema eleitoral contribui para garantir a representatividade dos cidadãos, porque o voto dado a um candidato menos votado ajuda a eleger outro candidato do mesmo Partido. Como os Partidos devem ter o mesmo ideário político, podemos esperar que todos os candidatos e candidatas do mesmo partido se identifiquem com o seu projeto. Daí a importância de terem os candidatos a mesma identidade partidária, não reduzindo o Partido a uma simples legenda eleitoral. Havendo coerência partidária, não existe “voto perdido” em eleições proporcionais (exceto quando o Partido não alcança o quociente eleitoral).

Mas esse sistema pode também distorcer a representatividade ao facilitar a eleição de políticos profissionais que estimulam a candidatura de pessoas desinformadas, somente para acrescentarem votos ao seu Partido. Tais políticos induzem pessoas estimadas em suas comunidades a se candidatarem à Câmara de Vereadores, porque elas trazem votos sem contudo colocarem em risco seu favoritismo. Passadas as eleições, essas pessoas descobrem que foram usadas apenas como alavancas eleitorais.

Talvez você conheça um desses casos em que a politicagem prejudica as comunidades: uma pessoa de liderança se candidata a vereador, vê seus votos favorecerem quem não merece e frustra-se com a política. Isso não acontece com quem sabe que sua candidatura visa apenas colaborar com seu Partido. Quando, porém, a pessoa é envolvida na campanha na ilusão de conseguir eleger-se, a frustração pode ser grande. Em geral, sua campanha não destaca o Partido, mas sim sua vida pessoal e familiar, sua participação na Igreja, sua honestidade pessoal e outros temas alheios à política. Por isso não são raros os casos em que líderes usados para alavancarem campanhas de políticos profissionais provocam divisões na comunidade.

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É evidente que os cristãos leigos e leigas podem e devem participar de campanhas eleitorais, mas é preciso que essa participação tenha bem clara as regras do jogo eleitoral. E nunca esquecer a recomendação de Jesus:

Eis que vos envio como ovelhas no meio de lobos; sede pois prudentes como as serpentes e simples como as pombas” (Mt. 10, 16).

Entender o atual sistema eleitoral, com suas regras de afiliação partidária e apuração dos votos, é importante para saber qual será o destino do nosso voto. Voto para vereador não se “perde”, porque conta como legenda para um Partido. Informar-se sobre os outros candidatos lançados pelo Partido do candidato em quem desejamos votar, é tão ou mais importante quanto informar-se sobre suas qualidades e sua capacidade para o exercício de cargo político. Não esquecer que o voto vai primeiro para o Partido e só depois para o candidato.

Agora que você conhece o “detalhe” aonde pode se esconder a politicagem nas eleições para vereador, procure refletir sobre os candidatos e candidatas que estão pedindo seu voto. Algumas perguntas podem ajudar:

  • Como essas pessoas apresentam seu Partido?
  • Elas são parte de um projeto político-partidário sério e democrático, ou só vão “alavancar” algum político profissional?
  • Você está disposto a colaborar para a vitória de uma candidatura na qual confia? Se você tem vontade de colaborar, ótimo! Mas não se deixe iludir por políticos espertalhões.

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BOLETIM 7 – AGOSTO- 2008

O PROCESSO ELEITORAL

Acesse a versão integral do Projeto Eleições 2008 n. 7

Desde Fevereiro viemos refletindo sobre a participação cidadã nas políticas públicas. Essa participação tem seu ponto mais visível no processo eleitoral, quando a população toda escolhe quem em nome dela vai definir, gerir e fiscalizar as políticas públicas, mas de modo nenhum termina no dia da eleição.

No boletim de Maio, ao falarmos sobre a divisão dos Poderes como um dos pilares da democracia, dissemos que em geral o povo espera do Executivo mais do que ele pode fazer, mas desconhece a importância do Legislativo. Essa concepção é prejudicial à democracia porque a participação da sociedade junto ao Poder Legislativo é indispensável no combate à corrupção. E essa participação deve começar desde a sua base, isto é, nas câmaras municipais.

Sabemos que a autonomia política do Município significa, entre outras coisas, que Prefeito, Vice-Prefeito e Vereadores são eleitos pelo voto secreto e direto dos cidadãos e cidadãs daquele município. Mas pouca gente sabe o que fazem os vereadores e vereadoras depois de empossados. Para esclarecer esse assunto, vejamos qual é seu trabalho na Câmara Municipal e como podemos acompanhá-lo.

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A Câmara Municipal representa o Poder Legislativo em âmbito local, tendo as funções de legislar e fiscalizar o Poder Executivo. Por isso, os vereadores podem regulamentar o trabalho dos servidores municipais (mas não dos trabalhadores da iniciativa privada, que é de competência federal); podem estabelecer as normas para loteamentos e construções, desde que não contrariem disposições das leis maiores. Já sua função fiscalizadora é exercida quando votam o orçamento municipal, examinam e julgam as contas apresentadas pelo prefeito e acompanham a execução orçamentária. Os vereadores têm também a incumbência de auto-administrar a Câmara.

Para realizar essas funções, os vereadores elegem a Mesa Diretora e compõem as Comissões Permanentes – órgãos técnicos constituídos por no mínimo três membros. Elas devem emitir parecer sobre assunto de sua competência específica, realizar investigações e representar a Câmara. Cada município cria Comissões conforme a realidade local, mas duas não podem faltar: a de Justiça (para analisar a fundamentação legal dos projetos de lei) e a de Finanças (para fiscalizar e emitir parecer sobre as contas do Executivo). Em municípios grandes são frequentes também as Comissões de Educação, Saúde, Obras, Administração Pública, Defesa do Consumidor, Meio-Ambiente e Direitos Humanos.

Além de participarem das sessões plenárias, os vereadores e vereadoras devem participar de pelo menos uma Comissão permanente. Ou seja, se estiverem dispostos a trabalhar, a Câmara Municipal abrirá um grande leque de atividades possíveis. Mas, se não quiserem cumprir seu mandato com responsabilidade, o que a população poderá fazer? Quem fiscaliza os vereadores para saber se eles estão mesmo trabalhando em favor da população? Para isso existem os Grupos de Acompanhamento ao Legislativo.

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Em 1996 a Campanha da Fraternidade teve como tema “Fraternidade e Política”, tendo suscitado muitas reflexões e debates, como os que foram tratados nestes boletins mensais. Um desses debates foi justamente sobre o acompanhamento do Poder Legislativo desde a base municipal. A idéia veio de Chico Whitaker, que foi vereador em São Paulo. Sua experiência o levou a concluir que só é possível acabar com a corrupção se os políticos de conduta ética receberem apoio externo, porque o Poder Legislativo não se muda apenas por iniciativa interna de seus membros.

Em resposta a esse desafio, surgiram em diversos municípios Grupos de Acompanhamento ao Legislativo – GAL. Seu objetivo é fiscalizar de forma permanente a atuação dos vereadores na Câmara Municipal. O GAL respalda sua legitimidade no próprio significado da democracia representativa: se os vereadores são representantes do povo porque foram eleitos pelo voto popular, é direito do povo acompanhar o que fazem seus representantes. Assim, é em nome dos eleitores que atua o GAL. Veja como cabem aqui as palavras de Jesus a Nicodemos:

”Quem pratica o mal, tem ódio da Luz, e não se aproxima da luz, para que suas ações não sejam desmascaradas. Mas, quem age conforme a verdade, se aproxima da luz, para que suas ações sejam vistas, porque são feitas como Deus quer.” (Jo 3, 20-21)

O GAL está aberto à participação de qualquer pessoa que queira exercer a sua cidadania, sem restrição a crenças religiosas nem ideário político. Mas o grupo enquanto tal não pode ter vinculação com qualquer partido político.

Sua atuação assume formas bem diversas, conforme a realidade municipal. Em geral, procura enviar seus membros para ouvirem os discursos e observarem o comportamento dos parlamentares nas sessões da Câmara. Também envia cartas aos vereadores cobrando uma postura ética e, quando é o caso, o voto em favor de projetos que beneficiem a população. Nos municípios onde atua o GAL logo começa a ser sentida a diferença nos trabalhos da Câmara. Pelo lado interno, porque recebe o apoio de parlamentares éticos, que também combatem a corrupção e o clientelismo; pelo lado externo, porque ajuda os movimentos sociais locais a trazerem para a Câmara suas reivindicações. Enfim, o GAL tem desempenhado com êxito uma função educativa, fazendo desenvolver-se uma nova consciência política.

Concluindo. Ficar parado, lamentando o que há errado na política, não leva a nada. Alhear-se da política é fazer de conta que não se vê o que está no nosso dia-a-dia. Se desejamos para as futuras gerações um mundo mais justo, pacífico e equilibrado, não podemos nos tranquilizar porque a cada dois anos cumprimos o dever de votar, mas devemos desde agora fazer política. Seja participando da campanha eleitoral para eleger o candidato ou candidata em quem confiamos, seja participando de um Grupo de Acompanhamento ao Legislativo. O primeiro passo para isso é refletir:

  • Você já assistiu alguma sessão na Câmara de Vereadores do seu município? Pensa que, se houvesse membros do GAL observando a sessão ela seria mais proveitosa para o povo?

Então, conclua você mesmo o que deve fazer.

ARQUIDIOCESE DE BELO HORIZONTE – ELEIÇÕES 2008

BOLETIM 8

Com este boletim encerra-se o projeto de reflexão política para as eleições municipais de 2008. Quem acompanhou toda a série, certamente terá percebido que vários boletins fizeram críticas a certas idéias inscritas na cultura política brasileira. Talvez elas correspondessem a realidades antigas, mas já não correspondem mais à realidade política em vigor desde a promulgação da Constituição cidadã de 1988. De fato, estamos diante de um desafio novo: é preciso mudar nossa cultura política, nosso modo de pensar, para desenvolvermos uma verdadeira democracia em nosso País.

É claro que isso poderá levar muito tempo, como acontece a toda mudança nas formas de pensar e de agir. Veja bem: há apenas trinta anos, pouca gente se preocupava com a poluição dos rios. Muita gente jogava lixo no córrego, pensando que dali ele seguiria por algum rio até desaguar no mar, onde toda sujeira se dissolveria na enormidade das águas. Foi preciso muitas campanhas em favor da ecologia e do respeito à natureza, reforçadas por leis de proteção ambiental, para que essa mentalidade começasse a mudar. Hoje em dia, ninguém mais se sente no direito de jogar lixo nos córregos e rios, e quem o faz é objeto de censura dos outros. Assim também acontecerá com a consciência democrática: com perseverança, um dia teremos uma nova cultura política.

No próximo mês deveremos comparecer a uma seção eleitoral para votar, fazendo valer nosso direito de cidadãos e cidadãs. Muitas pessoas estarão colaborando como mesários ou fiscais de partidos, sentindo orgulho de prestarem um serviço à democracia. Dia de eleições deve ter um ar de festa cívica, ser um dia especial a partir do qual muita coisa poderá mudar em nossa cidade. Algumas pessoas, contudo, dirão que só votam por serem obrigadas e que o voto deveria ser facultativo. No fundo, prefeririam não se envolverem com a política, como se isso fosse possível. Não somos nós que nos envolvemos com política: é a política que nos envolve. A questão é saber como lidar com ela.

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Aqui entramos no ponto crucial: a ética da política. Desde a mobilização social do “fora Collor”, vem crescendo na sociedade brasileira a consciência da ética na política, isto é, o dever que têm os políticos de se comportarem conforme os preceitos da Democracia. Eles são obrigados a agirem com honestidade, fidelidade às promessas e a colocarem o bem-comum acima dos interesses individuais. Essa obrigação é tão forte que eles têm o mandato cassado quando se comprova eles cometeram alguma corrupção. Não é como no regime militar, que cassou mandatos de políticos para calar as vozes que se opunham ao autoritarismo: hoje só pode ter o mandato cassado quem comete desvios na conduta ética. Mas esta dimensão da ética, embora muito importante, não esgota sua aplicação à política.

Por isso, falar de ética da política é dizer que a política deve ser a realização dos princípios éticos na esfera pública. E quando se pergunta quais seriam os princípios éticos fundamentais, isto é, aqueles dos quais não se pode abrir mão, a resposta está nos Direitos Humanos. No mínimo, os direitos que, tendo sido incluídos na Constituição, tornaram-se direitos extensivos a todos os cidadãos e cidadãs de um País. Ou seja, a política como atividade humana deve ser regida pelo cumprimento dos Direitos Humanos, segundo sua hierarquia: os direitos referentes à vida devem prevalecer sobre os direitos referentes às coisas e os direitos referentes ao bem de todos devem prevalecer sobre os direitos referentes ao bem particular. Por exemplo: se for obrigado a cortar custos, o governo deve cortar antes o serviço da dívida pública do que os gastos com saúde e educação.

Neste ponto, a Ética fundamentada na razão moderna encontra-se com a “regra de ouro” da ética tradicionalmente ensinada pelas religiões: “não fazer nem permitir que seja feito aos outros aquilo que não queremos que nos façam”.

 

Isto nos ensina também o Papa Bento XVI, em sua encíclica sobre o amor. Sua reflexão sobre fé e política, e Igreja e Estado, conclui dizendo que o dever imediato de trabalhar por uma ordem justa na sociedade é próprio dos fiéis leigos. Estes, como cidadãos do Estado, são chamados a participar pessoalmente na vida pública destinada a promover o bem comum. Embora as manifestações específicas da caridade eclesial nunca possam confundir-se com a atividade do Estado, no entanto a verdade é que a caridade deve animar a existência inteira dos fiéis leigos e, consequentemente, também a sua atividade política vivida como “caridade social”.

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O tempo de preparação para as eleições municipais deve ser então dedicado à prática da verdadeira Política, que cria estruturas justas. O voto consciente é importante, mas ainda mais importante é o trabalho de conscientização política que pode ser feito nesses dias que antecedem as eleições, quando política é assunto em qualquer conversa.

Você que desde os primeiros meses do ano veio acompanhando a reflexão oferecida pela Arquidiocese de Belo Horizonte é agora convidado a dar mais um passo, com uma ação concreta:

  • Leve este boletim a outras pessoas para juntos debaterem a relação entre ética e política;
  • Se o grupo considerar proveitosa a leitura, estimule-o a fazer o mesmo com os boletins anteriores.
  • Enfim, convide esse grupo a participar ativamente das eleições, apoiando a candidatura que lhes pareça trazer maior contribuição para uma cidade onde reinem a Justiça e a Paz.

Esteja certo de que essa ação será de grande importância para construir em nosso País uma verdadeira Democracia: política, social, cultural, étnica e econômica. Mais que isso, ela fará a Igreja avançar em sua missão de anunciar e construir o Reino de Deus na história humana. Lembre-se sempre da exortação do Apóstolo:

Meus irmãos, se alguém disse que tem fé, mas não tem obras, que adianta isso?” (Tg 2, 14)

Estes folhetos foram produzidos pelo Núcleo de Estudos Sociopolíticos da Arquidiocese de Belo Horizonte e PUC Minas, em parceria com o Programa de Pós-graduação de Ciências da Religião.

Solicita-se a citação da fonte, para  a utilização deste material.